quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Meu trecho de livro favorito...


“Mas dias depois olhando o jornal, fiquei sabendo que o vizinho que se matara sob as rodas de um ônibus, onde se lançara gritando: “quero morrer, quero morrer”. Fiquei sabendo mais, que viera de uma cidade do interior, se empregara em um banco e se casara. A mulher não suportou a monotonia da vida que levava e recomeçou a traí-lo. Este fato me levou a profundas reflexões sobre o homem e sua condição. Os homens que se traem, por que se traem, por que mentem, quando e como se principia o processo de corrupção das pessoas. Parei aí. Era uma história patética, bastante vulgar, mas me serviu para um projeto: ganhar na loteria. Ganhar e percorrer as casas que vendem roupas usadas, casas de penhores, sebos, comprar tudo que puder, estoques inteiros para jogá-los ao mar. É como se eu quisesse me multiplicar mil vezes, ser mil vezes mais suicida (livros fracassados, roupas de mulheres e homens que já foram fracassados). Matar mil vezes a solidão a que eu próprio me impus, enclausurado nesse horrível terno da moda. Me libertar... Voltar para casa, nos setembros de lá. Meus amigos esperando na plataforma da estação, meus amigos, minha juventude, sem o fracasso de agora” (Ary Quintella, Oba, não temos mais Nirvanas, pág. 12).

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